segunda-feira, 15 de setembro de 2008

GOYTACAZ, O AZUL DA CIDADE

O Goytacaz de tantas paixões, desilusões e sonhos que não acabam nunca, é de 20 de agosto de 1912, embora dele seus fundadores tratassem desde o dia 6, quando dos festejos em louvor ao Padroeiro da cidade, Santíssimo Salvador. Segundo Álvaro Nogueira, jogador e dirigente dos primeiros dias do clube, o Goytacaz surgiu de um desentendimento havido no Clube de Natação e Regatas Campista. Anos atrás, numa das portas da ferragem Machado Vianna, ele contava que "na manhã do dia 6 de agosto de 1912, um grupo de saudáveis rapazes, sócios do Campista, quis passear de barco junto à margem direita do rio Paraíba, onde se acotovelavam os assistentes e, entre esses, as moças da alta sociedade, todos esperando a hora das regatas do Padroeiro. Um diretor do Campista negou o barco e os rapazes, revoltados, desligaram-se da agremiação, abandonando a canoagem para criarem o Goytacaz".
Da história do Goytacaz faz parte a nota publicada pela Folha do Comércio no dia 3 de setembro de 1912, que dizia: "Mais uma sociedade de alegres e entusiasticos rapazes foi organizada anteontem nesta cidade. É um rival do Internacional Foot-Ball Club, organizado dias atrás. O título da nova agremiação é Goytacaz Foot-Ball Club, ficando constituída assim a sua diretoria: Presidente, Luiz Cabral; vice, Roberto Mello; 1º tesoureiro, Oto Nogueira; 2º tesoureiro, Jaime Rego; 1º secretário, Rudá Martins; 2º secretário, Álvaro Nogueira; fiscal, João Cunha; procurador, Manoel Patrão".
No dia 20 de agosto de 1931, o jornal A Notícia, apresentando matéria sobre o aniversário do Goytacaz, escrevia que "um grupo de rapazes compostos dos Srs. Jaime Rego, Getúlio Campos, Antônio Caramuru, Oto e Álvaro Nogueira, João Ferreira de Araújo e Benedito de Sousa, reunidos na residência particular do Sr. Oto Nogueira, na Quinze de Novembro, vizinho à oficina dos ingleses, resolveu fundar o Goytacaz". A matéria, bastante longa, apresentava outros detalhes ligados às atividades do clube.
Mais recentemente, a Folha da Manhã ouvia a venerável figura de Augusto Machado Viana Faria (edição de 23 de outubro de 1982) que, entre outras coisas, contou que antigamente era muito difícil entrar para um time de futebol. "Os jogadores tinham que comprar uniforme, que, por sua vez, era importado. A camisa era de seda. As chuteiras especiais. Enfim, tudo era caro". Disse ainda que "quando fundamos o Goytacaz, não tínhamos dinheiro para comprar um terreno e construir o campo. Os primeiros treinos foram realizados na Praça da República, passando posteriormente para o campo do Luso-Brasileiro, localizado onde hoje está a Prefeitura, ou seja, na antiga casa de Finazinha Queiroz. Lá ficamos até o final da década de 20, quando passamos para uma área da fábrica de tecidos, na rua do Gás".
Sobre o nome e as cores do clube, o jornalista Hervê Salgado Rodrigues escrevia o seguinte na edição de 27 de novembro de 1977 do jornal A Notícia:
"Um dos maiores valores do Goytacaz FC - esse, patrimônio de nossa terra - é o seu nome. O adepto do alvi-anil orgulha-se do nome do seu clube, o qual considera o mais belo e expressivo de todo o Brasil. Nenhum mais representativo da terra a que pertence, nenhum exprimindo com abundância igual a esse identificação com as origens e tradições do meio e sua força telúrica.
Também nenhum outro município do Brasil dá-se ao luxo de ter uma tribo indígena com exclusividade. E uma tribo diferente, cujas origens ninguém identifica com convicção porque não há nada que ligue os goytacazes aos troncos principais das nações índias do Brasil. Elas não são gês, nem tapuias, nem aruaques, nem tupis, nem guaranis.
Quando José de Alencar criou o romance O Guarani, centralizando-o na figura do herói índio Peri e situou toda a ação do livro às margens do rio Paraíba, estava usando apenas a sua imaginação, inspirado, talvez, nos livros de Chateaubriand, como Les Amour de Deux Sayages. Peri não podia ser nunca um guarani, mas podia (ou devia) ser um goytacaz.
Por uma coincidência muito curiosa as cores desse herói que não é de capa e espada, mas de cocar e penas, eram (ou são) azuis e brancos. Numa cena muito lírica do romance, Ceci explica ao índio como os cavaleiros da idade média mantinham a tradição de usar em suas armas as cores das damas a quem serviam - Tu dás a Peri as tuas cores, senhora?, disse o índio/ - Não tenho, respondeu a menina; mas vou tomas umas para te dar, queres?/ - Peri te pede./ - Quais achais mais bonitas?/ - As de teu rosto e as de teus olhos./ - Ceci sorriu:/ - Tome-as; eu te as dou./ - Desde esse dia Peri enramou todas as suas setas de penas azuis e brancas.
É mais provável que os fundadores do Goytacaz não tivessem sido inspirados pelas cores de Peri, o bravo guerreiro, mas é certo que foi uma coincidência feliz. Mais feliz ainda foi, entretanto, a escolha do nome".
Da história do Goytacaz Futebol Clube constam algumas primazias, entre as quais a de ter sido o primeiro clube campista a jogar no Maracanã e em Brasília, de iluminar um estádio, de fornecer um jogador para a Seleção Brasileira em 1923, que foi Amaro Silveira, a de ter tido um seu ex-jogador (Amarildo) campeão do mundo em 1962, no Chile, e a de ter conseguido um tetracampeonato local numa época em que o romantismo ainda dominava entre os clubes do lugar.
Os mais antigos se recordam, saudosa e orgulhosamente, da primeira sede do clube na 21 de Abril, 14, do primeiro campo, em Guarus, na parte fronteira à Igreja de Santo Antônio; do campinho de treinos da Praça da República; dos ensaios no terreno do palacete Finazinha Queiroz, no Largo do Liceu, bem como do campo que possuiu em área da antiga fábrica de tecidos, na Rua do Gás, bem próximo ao rio Paraíba.
Presidiram o Goytacaz, além de Luís Cabral, o primeiro, Vicente do Amparo Ferraiuolli, em cuja administração o Goytacaz inaugurou a primeira praça de esportes iluminada do lugar, Osvaldo Cunha, Luís Sérgio Silva, Francisco Carvalhal, Augusto Faria, Salim Nagen, Ari de Oliveira e Souza, Jacinto Simões, Martinho Santafé, que iniciou a construção das arquibancadas, Domingos Guimarães, Abelardo Brito, Antônio Ribeiro Alvarenga Filho, Gumercindo Freitas, Sebastião Lírio, José Gabriel, Nílson Cardoso de Souza, Salvador Araújo Nunes, Édson Alvarenga, Antônio José Coutinho, Ramiro Alves Pessanha Filho, Rubens Vieira Rios, Roberto Krunfly, Rafael Martins, Edecir Oliveira, Jorge Fernandes de Souza, Amaro Escovedo, Amaro Gimenes e Antônio Evaldo Lopes Riscado.
O Goytacaz foi campeão campista nos anos de 1914, 20, 26, 32 (junto com o Campos), 33, 40, 41, 42, 43, 45, 48, 51, 53, 55, 57, 59, 60, 63, 66 e 1977 (junto com o Americano), e teve como valores exponenciais em seu elenco, desde os primeiros tempos, Amaro Silveira, David, Titio, Malvino, Gradim, Pires, Cobian, Bibino, Calombinho, Rebolinho, César, Artur, Tarceli, Manoel Lucas, Carlos Augusto, Nilton Barreto, Joceir, Zé Carlos, Rodoval, Pereira, Ronaldo, Pipiu, Berlito, Mauricinho, Alfeu, Dedé, Gérson, Jarbas, Valdir Negrinhão, Paulo Marcos, Ricardo Sales, Ricardo Batata, Jocimar, Piscina, Wílson Bispo, Augusto, Arturzinho, Sabidinho, Pasta Ruça, Caveira, Dudu, Menenel e muitos outros.
Da história do Goytacaz constam três outros momentos muito importantes, vividos pela família alvi-anil nos últimos anos. Uma delas, a volta do clube à Divisão Principal da FERJ. Outro, o surgimento da Vila do Curumim e, por último, a descida para a Segunda Divisão, em 89.
Para o primeiro desses capítulos históricos do clube da Rua do Gás, o jornal A Notícia, edição de 8 de janeiro de 1982, abria manchete na qual se lia: "A festa foi do povo na posse do presidente Amaro Gimenes: Goytacaz viveu momentos de muita emoção". Três clichês ilustravam a página, focalizando a mesa que presidiu os trabalhos da sessão solene do conselho, com Otávio Pinto Guimarães, presidente da FERJ na época, se fazendo presente, o carnaval dos torcedores na Rua do Gás, aos quais depois foi servido chope à vontade e a faixa em pano de saudação, da mesma torcida, ao presidente do clube. Em matérias menores, o jornal anunciava que Amaro Gimenes não tinha dúvidas de que o ano de 82 seria todo do Goytacaz, e que, pela manhã, antes da festa que foi à noite, os jogadores haviam trabalhado no Ari de Oliveira e Souza.
Os demais jornais locais e as emissoras de rádio do lugar também fizeram cobertura do acontecimento. O Jornal dos Sports do dia 10 de janeiro de 1982 publicava matéria, enviada pelo seu correspondente em Campos, dando conta de que "o Goytacaz reviveu, durante a posse festiva do presidente Amaro Gimenes, os seus dias de glória. A sessão teve momentos de emoção, como no instante em que o novo presidente foi conduzido à mesa por figuras importantes do clube. Na Rua do Gás, torcedores improvisaram um carnaval ao som dos surdos, tamborins e repiniques. Na sede social, em meio à decoração de hortências azuis e brancas e as bandeiras do clube, do município e do Brasil, cerca de 600 pessoas se espremiam para ouvir, principalmente, a oração dos novos tempos na palavra do novo presidente que, emocionado, declarava que "o clube viverá, a partir de hoje, um tempo de certezas e vitórias, porque o Goytacaz não nasceu para morrer".
Poucos meses depois, isto é, na noite de 23 de outubro de 1982, em jogo memorável, o Goytacaz derrotava o São Cristóvão por 3x0 e conquistava o título de campeão estadual da Segunda Divisão e, com isso, o direito de voltar à Divisão Principal. Zé Sérgio, Ditinho e Luís Carlos foram os autores dos gols, todos no segundo tempo, provocando na torcida que compareceu ao Estádio Godofredo Cruz uma alegria tão grande que a festa se prolongou por toda a madrugada, já aí no Ari de Oliveira e Souza, que teve seus portões abertos e as luminárias acesas, para que os dirigentes, jogadores e torcedores se confraternizassem e ouvissem do presidente Amaro Gimenes, olhos cheios d'água, apenas isto: "Estou gratificado".
Outro momento importante na vida do Goytacaz se relaciona com a inauguração da Vila do Curumim, numa área de cinqüenta mil metros quadrados, situada na Avenida Alberto Lamego. Lá já estão à disposição dos quase quinze mil associados do clube, piscinas, quadras, campo de futebol soçaite e um bar, além do campo de tamanho norma para treinamento do elenco alvi-anil. O projeto é bem mais arrojado, numa iniciativa do ex-presidente Antônio Eraldo Lopes Riscado, que também concluiu o segundo grande lance das sociais no Ari de Oliveira e Souza. Quando da inauguração da Vila do Curumim, que coincidiu com os 75 anos do Goytacaz, Antônio Eraldo Lopes Riscado declarou: "Sonho, sim. E quem não sonha? Mas prefiro mesmo é exercitar a capacidade de transformar alguns desses sonhos em realidade. Das mais viáveis, às mais ousadas".
O terceiro episódio dos últimos tempos, ao contrário dos dois anteriores, ainda entristece a torcida alvi-anil. É que o time de futebol não conseguiu reeditar campanhas passadas, se deu mal no Estadual 88 e voltou à Segunda Divisão, na qual espera ser campeão para se juntar, mais uma vez, aos grandes clubes do Rio de Janeiro e se defrontar com o Americano, seu eterno rival. Para isso, e como trunfo, conta de novo com a dedicada e inspirada administração de Amaro Gimenes, de novo presidente do Azul da Rua do Gás.

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